sábado, 13 de junho de 2015

Conheça um pouco da Praia do Balbino em Cascavel

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A localidade de Balbino pertence ao município de Cascavel e ao distrito de Caponga, estando localizada a 60 km da capital cearense. A viagem para Balbino dura cerca de uma hora e meia. Começa saindo de Fortaleza pela Avenida Washington Soares e seguindo por Aquiraz, pela CE 040, até Pindoretama, quando na entrada da cidade dobra-se à direita passando por Pratiús até o desvio para Balbino, indicado por uma placa. 

Neste percurso encontram-se diversos engenhos onde se podem comprar deliciosas rapaduras, mel de cana e açúcar mascavo. Prosseguindo por uma estrada de calçamento, caminho indicado pela placa, chegamos à entrada do Povoado de Balbino cujo traçamento das ruas não é regular. Logo na entrada, deparamos-nos com uma extensa área de mangue, onde acontecem alguns rituais como a extração da casca do mangue vermelho e do cajueiro utilizadas para o tingimento da roupa do pescador, produzida artesanalmente. 

O mangue segue até a praia. Deparamo-nos, também, com dois caminhos de terra batida: à direita um caminho no qual não passa carros e seguindo-o encontra-se a Lagoa; à esquerda encontramos um caminho mais firme, apesar de suas irregularidades, este nos dá acesso à sede do Projeto Coco (um Projeto de artesanato), às Igrejas, à praça, aos mercadinhos, ou seja, à parte mais habitada, seguindo na direção da praia. O povoado de Balbino foi sendo construído e caracterizado pelos seus moradores como uma Comunidade. 

Podemos perceber nas falas da depoente a presença da resistência no povo que formou Balbino, quando afirma que os índios e negros chegaram à localidade fugindo da escravidão e da Guerra do Paraguai, ou seja, desde os seus fundadores Balbino é constituído de um povo guerreiro e forte. Elemento também encontrado nas reportagens dos jornais. Por fim, encontramos a sugestão da existência de uma “raiz antiga” legitimadora da criação de um povo com as suas singularidades, os pescadores, os filhos de Balbino. 

"Bom, a história do Balbino ela surgiu praticamente, os avós da gente que foram os principiantes, as raízes, então juntou aquela pequena comunidade, que era pouca mermo, você chegava lá e contava quantas pessoas moravam no vilarejo, era bem pouquinho, tinha a Lagoa Seca, que era mais o pessoal mais velho que morava lá ao redor da Lagoa Seca num cajueiro, num era uma casa, era um cajueiro que se fazia a casa e morava dentro, naquele tempo inda era assim e a vivência era pescador, morava ao redor de uma Lagoa, que era a Lagoa Seca, então lá se criaram os pescadores, os homens que começaram a vida de Balbino, no caso ele lá se chamava é, Antônio Balbino, o mais velho, a raiz antiga né, chamava-se Antônio Balbino."

Como podemos observar nessa fala de Seu Pedro, emerge uma raiz antiga que deu origem à localidade, raiz esta representada na figura de um homem, chefe de família, chamado de Antônio Balbino, homem que morava ao redor da Lagoa Seca em casa improvisada, numa integração com a natureza onde se desenvolveu uma vivência da pesca, forjando os pescadores. Esta figura primeira, Antônio Balbino, frutificou as terras praianas, gerando filhos, pescando, construindo um lar e marcando o começo da Comunidade.

Podemos perceber claramente essa narrativa histórica como um mito de origem, portador das características fundamentais de um mito citadas por Lévi-Strauss. A função explicativa pode ser identificada no encontro das duas etnias, negra e indígena, representadas na figura de Antônio Balbino. Antônio Balbino é um ícone, pois nomeou a Comunidade, como sugeriu os depoentes citados, de homens que fugiram em busca de liberdade, destaca-se o primeiro Balbino, que nomeou o lugar e seus habitantes. Dona Francisca, continua, referindo-se a essa origem, dizendo que “aí eles eram moreninho, agora tem alguém que não é, mas continua numas corzinhas bonitas, por que não tem nenhum assim alvo, alvo não, [são] as cores bonitas...” Justificando a união das raças. 

A função organizativa está expressa na constituição da Comunidade, formada por pescadores originários de uma mesma família. A pesca e o parentesco articulam os moradores e estruturam as relações sociais. Podemos perceber isto quando Dona Francisca se apresenta: “Eu sou Francisca Ferreira Faustino, tenho 66 anos, nasci aqui na comunidade de Balbino, me criei aqui, meus pais, meus avós, tudo nasceram aqui. Desde pequena, desde criança que a gente ajuda meus pais na agricultura e na pesca...”

A função compensatória pode ser compreendida pelas perdas ocorridas em um presente recente com a invasão imobiliária sofrida pela Comunidade em 1980, gerando, por exemplo, a redução da área do mangue, a redução da lagoa, a falta de peixe, em contrapartida o passado da Comunidade é marcado pela abundancia de um paraíso. 

Fazendo uma análise da situação atual de Balbino, segundo os dados da Associação de Moradores de Balbino, a localidade possui aproximadamente 964 moradores e 200 casas que começam na entrada da localidade e vão seguindo em direção ao mar, neste caminho encontramos o silêncio, animais como garças e outros pássaros, além de vários coqueiros que nos acompanham até a praia. 

Os homens caminham pelas ruas à-vontade, apenas de bermudas, alguns param em um pequeno bar para cumprimentar os compadres e beber uma dose de cana, outros encontram-se sentados em pequenos bancos de madeiras em varandas, ou quintais, de suas casas e parecem muito concentrados em um trabalho de remendar tarrafas para que mais tarde essas possam ser jogadas ao mar. As mulheres não aparecem com frequência pelas ruas, permanecem em suas casas com a família, ou em trabalhos de renda e domésticos. 

Os jovens transitam com maior frequência, em bicicletas e a pé trilham apressadamente caminhos. Quando chegamos à praia avistamos jangadas espalhadas pela areia e entre elas encontravam-se algumas barracas de pescadores, onde se pode comer um bom peixe-frito ou tomar uma água de coco. O mar e sua imensidão, sem muitos banhistas, apenas algumas crianças que brincam com as ondas e dividem o cenário com jangadas que flutuam nas águas de Balbino.

A origem da Comunidade de Balbino atualmente é transmitida nas falas dos sujeitos locais, em documentos recentes, em outros meios e em novas expressões culturais desenvolvidas no local, como o teatro e o cordel. Existe um grupo de jovens que apresentam uma peça sobre a origem da localidade, inclusive esta peça está disponível nos meios eletrônicos, através do site youtube. Outra forma de transmissão da história da localidade, apresentada por sujeitos entrevistados, foi um cordel, criado pelos alunos com o auxílio dos professores. Esse contar-se, que se faz em múltiplas linguagens, figura-se como um modo de colocar no mundo o mundo que acreditamos e vislumbramos. 

Desse modo os sujeitos habitam a sua própria fala e essa fala os move, os transforma. Os moradores de Balbino, especialmente as suas lideranças, criam e recriam narrativas de si, para partilhar com outros a sua experiência. Além dos já citados, encontramos outros modos de transmissão da própria história que a comunidade tem construído. 

Nos documentos da Associação de Moradores de Balbino, foi encontrado um texto escrito como História de Balbino, que começa dizendo que: “Conta-se que há mais de 200 anos atrás, alguns negros cansados de serem escravos, resolveram fugir em busca de uma terra para viverem. Nessa fuga chegaram a um lugarzinho do litoral, muito belo, verde, com lagoas, rios e mangues. Um lugar ideal para viverem, e, então ficaram.” Esse mesmo texto faz referência a que já existiam moradores antes da chegada dos negros, que eram os índios, estes se juntaram com a família do Sr. Balbino e deram origem à população existente. Esse texto não tem assinatura e nem data, mas é um registro produzido pelas lideranças locais. 

No cordel, sem data, de autoria do estudante Gustavo Oliveira e de Camila Batista, ex-professora da localidade, há uma estrofe que diz: “Pra vocês que ainda não sabem, tudo começou assim/ Há mais de duzentos anos esse povo vive aqui/ Misturou- 9 se negros com índios que já viviam aqui”. Nesses discursos mais recentes, vai sendo demarcado uma temporalidade mesmo sem datação, a fusão de raças/etnias como genealogia do povo atual. O tempo antigo exprimido como paraíso também aparece nos versos: “a natureza dava tudo o que o povo precisava/ tudo era repartido, quando plantava e pescava/ O cozido era grande e a fome saciava.” 

Esta fala sobre si estrutura uma imagem paradisíaca da Comunidade, compondo-a como um lugar cálido, homogêneo, um paraíso que foi maculado pela especulação imobiliária na década de 1980. Esta ideia paradisíaca de Comunidade remete-nos a observação Bauman “Comunidade é nos dias de hoje outro nome do paraíso perdido – mas a que esperamos ansiosamente retornar, e assim, buscamos febrilmente os caminhos que podem levar-nos até lá” (2003, p.9). Assim, deparamo-nos com um momento precipitante da (re)invenção da Comunidade de Balbino para si mesma e para os outros, momento que tem nas práticas culturais locais um de seus elementos constitutivos. 

Fonte:  Por Camila Mota Farias Graduanda em História pela Universidade Estadual do Ceará (UECE); Integrante do Laboratório de Estudos e Pesquisas em História e Culturas /http://www.ce.anpuh.org/1342320420_ARQUIVO_Artigo-ANPUHREGIONAL.pdf

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